terça-feira, 21 de julho de 2009

Sempre vejo anunciados cursos de oratória...


Sempre vejo anunciados cursos de oratória.
Nunca vi anunciado curso de escutatória.
Todo mundo quer aprender a falar.
Ninguém quer aprender a ouvir.
Pensei em oferecer um curso de escutatória.
Mas acho que ninguém vai se matricular.
Escutar é complicado e sutil.
Daí a dificuldade:
a gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem
logo dar um palpite melhor,
sem misturar o que ele diz com aquilo que
a gente tem a dizer.
Como se aquilo que ele diz não fosse digno
de descansada consideração e precisasse ser
complementado por aquilo que a gente tem a dizer,
que é muito melhor.
Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação
mais constante e sutil de nossa arrogância e vaidade:
no fundo, somos os mais bonitos...
Falar logo em seguida seria um grande desrespeito,
pois o outro falou os seus pensamentos,
pensamentos que ele julgava essenciais.
São-me estranhos.
É preciso tempo para entender o que o outro falou.
Se eu falar logo a seguir, são duas as possibilidades.
Primeira: "Fiquei em silêncio só por delicadeza.
Na verdade, não ouvi o que você falou.
Enquanto você falava,
eu pensava nas coisas que iria falar quando
você terminasse sua (tola) fala.
Falo como se você não tivesse falado".
Segunda: "Ouvi o que você falou.
Mas isso que você falou como novidade
eu já pensei há muito tempo.
É coisa velha para mim.
Tanto que nem preciso pensar sobre
o que você falou".
Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo.
O que é pior que uma bofetada.
O longo silêncio quer dizer:
"Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou".
E assim vai a reunião.
Não basta o silêncio de fora.
É preciso silêncio dentro.
Ausência de pensamentos.
E aí, quando se faz o silêncio dentro,
a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.
Eu comecei a ouvir a experiência,
e se referia a algo que se ouve nos interstícios
das palavras, no lugar onde não há palavras.
A música acontece no silêncio.
A alma é uma catedral submersa.
No fundo do mar - quem faz mergulho sabe -
a boca fica fechada.
Somos todos olhos e ouvidos.
Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia,
ouvimos a melodia que não havia e
que de tão linda nos faz chorar.
Daí a importância de saber ouvir os outros:
a beleza mora lá também.
"CoNcluo é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto."

2 comentários:

Anônimo disse...

Lindo seu texto, reflexivo, se deixassemos fluir esse silencio, com certeza nos sentiriamos bem melhor,bju querida!

Mιяεℓℓү ɑɳɗʀɑɗɛ disse...

E sim eu tbm amo este texto pq ele fala mesmo claramente que devemos calar mais e ouvir muito mais!!
BJOS E OBRIGADO PELA VISITINHA!!

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